“O sapo tem dificuldade de perceber as mudanças de temperatura. Por isso, dizem que se colocar um sapo na panela com água para ferver, ele só percebe o perigo quando já está quase cozido. Do mesmo jeito está a população em relação à PEC 55”.
Foi desta maneira que o deputado federal Leo de Brito (PT-AC) deu início à sua explanação sobre a PEC 55 durante o encontro promovido no auditório do MP de Cruzeiro do Sul.
PEC da maldade, PEC da morte ou até mesmo PEC do Fim do Mundo são alguns dos adjetivos conferidos à proposta de emenda constitucional apresentada pelo Governo Temer ao Congresso.
Muita gente ainda não se deu conta da gravidade que é a aprovação da PEC 55 (ex-PEC 241). A grosso modo trata-se do congelamento dos gastos em saúde e educação no país por ‘apenas’ 20 anos. As chamadas ‘medidas impopulares’ são vendidas à população como o remédio amargo, porém necessário, para vencer a crise econômica, e por isso, acaba tendo a aceitação, ou a acomodação da população anestesiada.
A hipnose coletiva é promovida pelo mantra de que o país precisa das ‘medidas de austeridade’. Na última terça-feira em meio ao luto nacional pelo desastre aéreo que vitimou 76 pessoas da delegação do chapecoense, o senado aprovou as medidas em primeiro turno. Enquanto cerca de 20 mil pessoas recebia o comitê de boas vindas da ‘casa do povo’: balas de borracha, bombas de efeito moral e spray de pimenta, parlamentares que votaram pela proposta do governo Temer comemoravam com champanhe e caviar.
Contudo, mesmo para quem já tem uma ideia da dimensão da farsa que está sendo montada para a aprovação de tais medidas, é ainda mais assustador conhecê-las de perto.

“Ninguém discorda de que o governo precisa gastar proporcionalmente ao que arrecada”, deu início o deputado. “Mas a lei de responsabilidade fiscal já determina tal coisa. Qual a necessidade de se aprovar uma medida de ajuste fiscal por 20 anos?”, pergunta.
O argumento usado pelo governo de que tais medidas já foram adotadas em outros países, omite o fato de que em nenhuma nação as medidas impunham-se por tanto tempo e tampouco foram propostas como reforma constitucional.
“Vinte anos é muito tempo. A população aumenta. A arrecadação tende a aumentar com a recuperação da economia. Mas os gastos permanecerão congelados. Em vinte anos, passarão cinco legislaturas e cinco presidentes. Os futuros gestores e legisladores estarão amarrados para fazerem novos investimentos em saúde e educação.”, explica Leo de Brito.
Trata-se de um (mais um) golpe na democracia, promovido por um governo tampão.
O deputado acredita que há razões de sobra para determinar a inconstitucionalidade da PEC.
“A PEC mexe em cláusulas pétreas da constituição como as que garantem os direitos do cidadão à saúde e educação. Congelando os gastos, o investimento per capita irá diminuir ao longo dos anos”.
“Na educação já estamos sofrendo impacto da redução de recursos isso implica diretamente ao acesso e direitos garantidos pela constituição e pela LDB. Com a PEC será difícil garantir a universalização do acesso à educação. Talvez muitas pessoas não consigam ter esse acesso.“, afirma Charles André, gerente regional de educação da SEE.
A expectativa é de que a saúde pública será ainda mais impactada pela PEC. Enquanto na educação a estimativa é de uma perda de receita da ordem de 50 bilhões de reais, e na área social, 168 bilhões, a saúde deverá sofrer uma perda 743 bilhões. Com o natural envelhecimento da população e a maior procura pelo SUS, o quadro deverá se agravar nos próximos anos, com o completo sucateamento do sistema público.
Para Itamar de Sá, coordenador regional de saúde no Juruá, há sim a necessidade de se promover uma gestão mais eficiente na saúde, mas há também falta de recursos para garantir o acesso da população às ações de saúde. “Nos últimos anos, tivemos aumento de investimentos da ordem de 33% acima da inflação. Com isso podemos imaginar como ficará a saúde daqui há alguns anos, caso a PEC venha a ser aprovada. Prevemos tempos difíceis com o sucateamento do SUS. Pode representar fechamento de UTIs, redução de número de leitos, diminuição ou cancelamento de serviços que são prestados de forma gratuita. Veremos o crescimento da saúde privada, ampliação das empresas que vendem plano de saúde, clínicas e hospitais particulares” explica.
Leo de Brito concorda com a avaliação de avalia que a expansão do setor privado em detrimento do público na saúde (o mesmo sendo aplicado à educação), não se trata de um ‘efeito colateral’ da PEC, mas talvez o seu real objetivo. “Muitos parlamentares tiveram suas campanhas financiadas pelas empresas de planos de saúde”, explica. O mesmo pode ser aplicado ao lobby da educação privada, para quem interessa o sucateamento do sistema público.
Para o deputado Leo de Brito há pouca chance de reverter o quadro no congresso. Perguntado se ainda seria possível que as manifestações populares sensibilizassem os parlamentares contra a PEC, Leo de Brito foi taxativo: ‘A sensibilidade de quem está votando na PEC são os cargos federais que está sendo distribuídos e a liberação de emendas parlamentares. Infelizmente é a política como ela é”, conclui.

