Nenhum Estado brasileiro atualmente está livre de confrontos entre facções criminosas. Tal realidade fez crescer o número de homicídios no País, segundo a Abin (Agência Brasileira de Inteligência).
A PF (Polícia Federal) vê uma escala armamentista entre as facções e diz que a “situação é bem crítica” na região amazônica, incluindo confrontos entre os grupos CV (Comando Vermelho) e FDN (Família do Norte), embora a segunda esteja perdendo relevância a partir de um racha interno e de uma operação conjunta de repressão desencadeada pela PF e Ministério Público.
O quadro foi apresentado nesta terça-feira (4) por representantes da Abin e da PF em Brasília ao CJF (Conselho de Justiça Federal) em seminário promovido por juízes federais para sugerir mudanças nas regras do sistema penitenciário federal. “No Acre, as facções disputam acesso de rotas. O Comando Vermelho chegou recentemente para disputar a rota lá. Essa disputa fez aumentar significativamente a violência. Hoje o Acre está entre os três Estados mais violentos do País. Assim é em todos os Estados, sempre onde há disputa acirrada entre facções, tem sido elevado o número de homicídios”, disse Gustavo Bezerra, servidor da Abin.
O tema das facções criminosas passou a ser de interesse da agência porque “adquiriu contornos que necessitam atenção além dos órgãos de segurança tradicionais”, uma criminalidade organizada que “representa grave ameaça à sociedade, ao Estado e à segurança institucional”. A Abin vê “uma escalada do poderio bélico” das quadrilhas, com “ataques ostensivos e execuções seletivas” de servidores públicos da segurança.
“São modos de agir que as facções empregam a fim de impor sua agenda ao Estado”, disse Bezerra, citando documento apreendido em Boa Vista (RR) que mostrou que o PCC (Primeiro Comando da Capital) havia “mapeado as casas de policiais militares”. Em outro episódio, em junho passado, foi apreendida em Fortaleza (CE) “uma granada do Exército peruano, o que demonstra que tiveram acesso a armamento numa cidade localizada a mais de 6 mil km de distância”, segundo Bezerra.
Coordenador de repressão a crimes violentos da Polícia Federal, o delegado Alexandre Custódio Neto afirmou aos juízes federais na plateia que “nos últimos anos houve aumento considerável de casos de tráfico de armas, especialmente fuzis e pistolas, e munições em grandes carregamentos” do Paraguai para o Brasil”. Também foi detectado, segundo o delegado, “em 2017 e 2018, um aumento de contrabando de armas de origem norte-americana”, mas remetidas da Bolívia, em um “intenso tráfego de pequenas aeronaves entre Bolívia, Peru, Paraguai e Brasil”.
No Norte do País, segundo o delegado, as cargas com drogas “estão subindo com escolta [armada] pelos rios amazônicos”. São contratados “grupos especializados em assaltos a banco” para atuar na logística de transporte. Nos portos há também “a logística de outro grupo criminoso”. “É importante dizer que não existe [apenas] um negócio da facção, existem vários grupos e quadrilhas que integram as facções. Se eles tiverem como se associar a outro membro da facção, o farão. Não há como imaginar que estamos falando de uma organização de 30 mil homens de um grupo único, com caixa único. Não é assim que funcionam as coisas”, disse Custódio.
A PF estabeleceu critérios básicos para definir uma facção criminosa: atuação em âmbito nacional, contrapartida de seus integrantes (em dinheiro ou prestação de “serviços”) e algum grau de poder político. Para o órgão, apenas três grupos se enquadram nessa definição, o PCC, o CV e a FDN. O Ministério da Segurança Pública trabalha com número bem maior, de 80 facções, mas o delegado considera que muitas são apenas “grupos locais, algumas são verdadeiras gangues e atuam no bairro”.
Custódio afirmou que a hierarquia do PCC e da FDN é “rígida”, com algumas das principais ordens centralizadas, enquanto a do CV é “delegada” e, por isso, mais difícil de ser combatida.


