BRASÍLIA — Grupo técnico ligado ao Ministério da Saúde desaprova, em novo parecer, o uso de medicamentos com ineficácia comprovada contra Covid-19, como cloroquina, hidroxicloroquina, ivermectina e azitromicina, em ambientes hospitalares. É a primeira vez em 14 meses de pandemia que há um posicionamento contrário de um órgão ligado à pasta em relação ao uso dessas drogas. O texto já recebeu parecer favorável da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec), que abriu consulta pública nesta segunda-feira. O prazo é de 10 dias.

Apesar disso, o ministério não traz orientações contra o “kit Covid”, defendido pelo presidente Jair Bolsonaro e apoiadores como “tratamento precoce”, mesmo sem evidências científicas. A recomendação quanto aos medicamentos é um dos alvos da CPI da Covid, no Senado. Em depoimento, o ministro Marcelo Queiroga afirmou que aguardava o parecer para decidir a orientação da pasta e que os médicos se dividiam quanto ao uso.

Chamado de “Diretrizes Brasileiras para Tratamento Hospitalar do Paciente com Covid-19”, o parecer foi divulgado pela “Folha de S.Paulo” e obtido pelo GLOBO. A coordenação é do pneumologista e professor da Universidade de São Paulo (USP) Carlos Carvalho.

Segundo o documento, não há evidências de que essas medicações, isoladas ou junto a outros remédios, beneficiem o tratamento da Covid-19. A recomendação contra a cloroquina vale para ingestão via oral, inalatória (off label, isto é, forma de uso que não consta na bula) ou outras. Há registros de pacientes que morreram após nebulização desse fármaco e os casos são investigados. No entanto, pacientes que já utilizam essa medicação contra artrite reumatoide e malária devem prosseguir no tratamento.

Quanto à ivermectina, ainda não há estudos em ambientes hospitalares, só em laboratório. Por ser antibiótico, a azitromicina só deve ser usada em caso de infecção bacteriana, não como parte da rotina de tratamento contra a Covid-19. Além deles, o grupo também não recomenda o uso de lopinavir ritonavir (coquetel que já foi utilizado contra o vírus HIV, causador da Aids), nem do anti-inflamatório colchicina, administrado no tratamento da gota.

O uso de plasma de pessoas que contraíram a doença e desenvolveram anticorpos também não é indicado, assim como a associação de anticorpos monoclonais casirivimabe e imdevimabe (Regn-CoV2), aprovada para uso emergencial e temporário pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por falta de evidências que sustentem o tratamento.

“Alguns medicamentos foram testados e não mostraram benefícios clínicos na população de pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados, sendo eles: hidroxicloroquina ou cloroquina, azitromicina, lopinavir/ritonavir, colchicina e plasma convalescente. A ivermectina e a associação de casirivimabe + imdevimabe não possuem evidência que justifiquem seu uso em pacientes hospitalizados, não devendo ser utilizados nessa população”, diz o documento.

Outros remédios, como dexametasona e hidrocortisona, além de anticoagulantes, são recomendados em casos específicos e dentro do ambiente hospitalar. O anticorpo monoclonal tocilizumabe também é uma opção. Dessa forma, o comitê avalia que há poucas opções de tratamentos farmacológicos contra a Covid-19. O documento sugere que o rendesivir, primeiro remédio anticovid aprovado no Brasil e utilizado nos Estados Unidos, não seja em administrado em face dos altos valores e da baixa chance de que seja ofertado no Sistema Único de Saúde (SUS).

“À exceção de corticoesteroides e do tocilizumabe, ambos em pacientes com uso de oxigênio suplementar, não há outras terapias que mostraram benefício na prevenção de desfechos clinicamente relevantes como mortalidade e evolução para ventilação mecânica. Algum benefício marginal pode ser obtido com o uso de rendesivir, contudo seu alto custo, baixa experiência de uso e incertezas em relação à efetividade não justificam seu uso de rotina”, conclui o parecer.

Procurado pela reportagem, o ministério não detalhou sobre o andamento desse parecer. Também não respondeu se pretende adotar ou modificar o documento. Em nota enviada ao GLOBO, afirmou que “elabora orientação no tratamento de pacientes em quadros graves de Covid-19, quanto ao uso adequado de oxigênio e suporte ventilatório, sedativos e bloqueadores neuromusculares, entre outros medicamentos”.

Fonte: O Globo.