A popularidade do jogo do tigrinho saiu das telas dos celulares e alcançou as manchetes dos jornais no último domingo, dia 3, devido a uma reportagem do Fantástico. O chamado Fortune Tiger, ou Jogo do Tigrinho, é investigado pela Polícia Civil do Paraná por esquema criminoso de apostas online.
O game promete ganhos rápidos e fáceis de altas quantias de dinheiro por meio de apostas. Com a ajuda de influenciadores digitais, como Sthe Matos, Kevi Jonny e Cristian Bell, o Fortune Tiger viralizou nas redes sociais e chamou a atenção das autoridades brasileiras.
Saiba mais porque o Jogo do Tigrinho é proibido no Brasil e o que aconteceu com os influenciadores que promoviam o jogo de azar responsável pelos problemas financeiros e emocionais de centenas de jogadores em nosso país.
Como funciona o jogo do Tigrinho?
O Fortune Tiger é um jogo de azar com temática inspirada no zodíaco chinês. Para jogá-los, as pessoas devem se inscrever na plataforma, fazer depósitos de dinheiro e rodas as bobinas para apostar na roleta.
Vence a partida quem tiver a “sorte” de combinar 3 símbolos nas linhas de pagamento. Os valores de aposta vão de R$0,50 a R$600 a cada rodada. Segundo os sites dos cassinos online que disponibilizam o jogo do tigrinho, seu RTP (Return-To-Player) é de 96,96% – percentual que indica a probabilidade do jogador ter retorno do dinheiro apostado.
O Fortune Tiger foi lançado em 2022 pela PG Soft. A empresa estrangeira é fornecedora dos jogos de slots (caça-níqueis digitais) mais populares do Brasil, apesar do seu sistema do game ser hospedado no exterior e não possui registro ou representantes no país.
Ela também é a desenvolvedora de outros jogos que seguem a mesma lógica que a do Jogo do Tigrinho, como Fortune Rabbit (jogo do coelho), Fortune Mouse (jogo do rato), Fortune Gods (jogo dos deuses) e Fortune Ox (jogo do boi).
Quais são as falsas promessas por trás do jogo de azar?
Parte da propaganda do jogo do tigre está nas possibilidades de altos ganhos. A promessa se baseia no multiplicador de 10x da roleta e em rodadas bônus re-spin, o que elevaria até 2.500 vezes o retorno da aposta feita.
No entanto, há diversos relatos na internet acusando o jogo de não pagar os ganhos acumulados na roleta e de jogadores que ficaram viciados nas apostas do jogo, perdendo todas as suas economias.
O diretor da faculdade de direito da UFPR, Sérgio Staut Júnior, explica a ilegalidade cometida por games como o Fortune Tiger: “São jogos que não tem regulamentação aqui no Brasil. São considerados jogos ilegais, de azar, e muitas vezes esses jogos são em sites fora do Brasil. Já as bets elas têm uma regulamentação, tem uma lei que permite esse tipo de aposta, em que você aposta no resultado. Se vai ser positivo ou negativo para um time, se o sujeito fez um gol”.
A legislação brasileira proíbe os jogos de azar no país desde 1946 pela gestão do general Eurico Gaspar Dutra. Recentemente, esse cenário sofreu algumas mudanças para diferenciar os jogos de azar das apostas dos jogos esportivos online.
A constituição classificava os jogos de azar em jogos cujo ganho ou perda dependam da sorte, apostas sobre corridas de cavalos e apostas sobre qualquer outra competição esportiva. Com a lei 13.756/2018, aprovada pelo ex-presidente Temer, as apostas esportivas passaram a ser enquadradas como loteria, o que é permitido no Brasil.
Para Fabiano Jantalia, especialista em direito de jogos e bancário, “o problema é que esta mesma lei previu a possibilidade de sua exploração, mas condicionou isso a uma regulamentação futura”. O que ainda não aconteceu em nosso país.
Assim como a PG Soft, a maioria dos sites de apostas está sediada em paraísos fiscais, burlando a legislação brasileira e dificultando a tributação, a fiscalização e a proteção dos direitos de quem joga.
Segundo o advogado criminalista Paulo Crosara, esse impasse causa insegurança jurídica, o que leva os juízes a analisarem caso a caso. “A pessoa apostou e não teve o prêmio pago. Você pode levar essa casa de aposta na Justiça? Você pode exigir esse dinheiro” esclarece o especialista ao O Tempo.
Crosara também ressalta que os sites de apostas esportivas costumam oferecer jogos online que ainda são proibidos no Brasil, como cassino, blackjack e caça-níqueis. “Isso gera confusão nos jogadores”, diz o advogado.
“Tem pena de prisão prevista, mas ninguém vai preso por causa disso. Hoje em dia tem juizados e a pessoa paga uma multa. Isso resolve numa audiência. Você paga e morreu a conversa”, ele explica.
Quanto aos donos desses estabelecimentos, a Justiça penaliza de forma diferente. “Quem vai preso é por associação criminosa, lavagem de dinheiro e não em si pelo jogo de azar”, esclarece Crosara.
Não se podem ignorar também o perigo para a saúde mental que os jogos de azar representam. A dependência leva a problemas de cognição e relacionamentos, além perda de dinheiro. Esse tipo de vício é ainda mais silencioso que a dependência em álcool e drogas, pois os sintomas físicos não são óbvios.
Divulgação dos influencers: a prática ilegal nas redes sociais
Nas redes sociais, há influenciadores digitais que se tornaram porta-vozes do jogo do tigrinho, ensinando como jogar, promovendo rifas eletrônicas e fazendo publicidade ao contar suas histórias de superação após fazerem apostas no game.
Nos discursos propagados em vídeos e imagens, o Fortune Tiger seria a fonte de renda desses “influencers”, proporcionando uma vida luxuosa com direito a compra de carros de luxo, joias e mansões.
A investigação da Polícia Civil descobriu a realidade por trás dos bastidores dessa ostentação. Segundo as autoridades da operação, os influenciadores praticavam uma ilegalidade ao divulgar o jogo do tigrinho nas redes sociais, atuando como aliciadores do esquema criminoso.
Em Curitiba, quatro influenciadores com cerca de 1 milhão de seguidores chegavam a ganhar de R$ 5 mil a R$ 15 mil por campanha semanal, além do lucro obtido pelo cadastro de novos jogadores, de R$ 10 a R$ 30 por inscrição.
Pirâmide financeira: a investigação policial em andamento
A promessa de ganhos elevados nas redes sociais foi o que chamou a atenção dos policiais, que passaram a suspeita do esquema de pirâmide financeira. Na web, os vídeos de influenciadores ganhando R$ 250 em um clique e usando notas de R$ 100 para se abanar ganhavam milhares de curtidas e compartilhamentos.
A primeira operação policial, Quebrando a Banca, veio a público em setembro. A Polícia Civil do Maranhão fez buscas na casa da influenciadora Skarlete Mello, que divulgava o jogo do tigrinho no seu perfil e agora está sendo investigada por promover jogos de azar, loteria não autorizada, organização criminosa e lavagem de dinheiro.
“Mais de R$ 1 milhão em dinheiro foi apreendido, tivemos a apreensão de pelo menos três veículos importados”, afirma o delegado da Polícia Civil do Maranhão, Augusto Barros. Outros 15 influenciadores já foram ouvidos pelas autoridades e o caso levou à a criação e implementação de uma lei que proíbe a divulgação das plataformas de jogos de azar no estado.
No dia 19 de novembro, foi a vez da Polícia Civil do Paraná investigar os quatro influenciadores de Curitiba. Três foram presos, Eduardo Campelo, Gabriel e Ricardo. Ezequiel, que também fazia parte do grupo, está foragido.
A prisão aconteceu junto com a apreensão de carros e dólares em espécie. Estima-se que o grupo movimentou cerca de R$ 12 milhões em 6 meses. Apesar do trio ter sido solto no mesmo dia, eles continuam sendo investigados por exploração de jogos de azar, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
A defesa de Skarlete não quis se pronunciar na reportagem do Fantástico e os advogados dos influenciadores do Paraná afirmaram que seus clientes são inocentes pois não controlam a plataforma de jogos.
A polêmica em torno do Jogo do Tigrinho destaca mais uma vez as lacunas na legislação brasileira, assim como a responsabilidade dos influenciadores digitais ao promoverem práticas questionáveis, como o golpe que promete dinheiro por likes.
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