A dor e a revolta tomam conta de Mirtes Góes, mãe de Michael Luiz dos Santos Paes, detento que morreu dentro do presídio de Senador Guiomard, no interior do Acre. O caso, registrado como suicídio, vem sendo contestado pela família, que aponta possíveis falhas na assistência prestada e cobra uma investigação mais profunda sobre as circunstâncias da morte.
Mirtes, que atualmente mora em Aracaju (SE), contou que o filho sofria de bipolaridade e depressão e fazia uso de medicamentos controlados, sempre com acompanhamento psiquiátrico. Segundo ela, em julho deste ano, quando esteve em visita ao presídio para deixar a medicação, foi impedida pela direção e pela assistência social de entregar os remédios ao filho.

Michael, segundo Mirtes, enviava cartas constantes pedindo os medicamentos e relatando crises de ansiedade | Foto: Cedida
“Disseram que só aceitariam medicamentos receitados pelos médicos do presídio. Fui destratada, me senti mal. Ele tomava esses remédios há anos e nunca tinha tido problema para receber”, relatou a mãe, emocionada.
Michael, segundo Mirtes, enviava cartas constantes pedindo os medicamentos e relatando crises de ansiedade. A última correspondência, datada de 10 de outubro, trazia um pedido de socorro:
“Mãe, estou com muita dor e estou pensando em fazer besteira. Não aguento mais esse inferno”, escreveu.
Carta enviada por Michael para a mãe | Foto: Cedida
Além da luta pela saúde mental, a família afirma que o detento havia sido agredido dentro da unidade prisional cerca de três meses antes da morte. Conforme o relato da mãe, ele teria se envolvido em uma discussão com outro preso e, durante a contenção feita por policiais penais, foi atingido por disparos, resultando em fraturas e ferimentos graves.
“Me disseram que foram disparados tiros à queima-roupa. Ficou com o rosto costurado, costelas quebradas e passou dois meses na enfermaria. Isso tudo me deixa com muitas dúvidas”, lamentou.
Após se recuperar, Michael foi colocado sozinho em uma cela, mesmo com histórico de tentativas anteriores de suicídio. Segundo a mãe, o isolamento agravou o quadro de depressão. A família tentava, desde então, transferi-lo para um presídio em Aracaju, onde ela poderia acompanhá-lo mais de perto — o pedido ainda estava em tramitação.
Mirtes contou que recebeu a notícia da morte do filho apenas horas depois do ocorrido. “Uma funcionária me ligou e perguntou se eu era a mãe do Michael. Quando perguntei onde ele estava internado, ela disse: ‘a senhora não entendeu, ele veio a óbito’.”
O corpo foi sepultado em Rio Branco, e Mirtes chegou à cidade pouco antes do enterro. “Foram 20 anos de luta com meu filho. Eu entreguei ele para o Estado pensando que ele pagaria a pena, mas me devolveram ele morto. Quero acreditar que ele se matou, mas quem pode garantir isso?”, questionou.
A mãe diz ainda ter recebido relatos de que outro preso teria morrido em circunstâncias semelhantes na mesma unidade, apenas dois dias depois. Para ela, os casos levantam suspeitas de falhas graves na gestão prisional.
“Meu filho vinha tentando mudar de vida. Tinha planos, queria ver ele terminar a faculdade. Eu só quero saber a verdade e que ninguém mais passe por isso”, desabafou.
A família informou que deve acionar a Justiça e o Ministério Público para acompanhar as investigações e pedir esclarecimentos formais sobre o que realmente aconteceu dentro do presídio de Senador Guiomard.
A reportagem questionou o Instituto de Administração Penitenciária do Acre (Iapen), órgão responsável pela gestão do sistema prisional no estado, sobre as denúncias feitas pela família. Em nota, o Iapen afirmou que o detento recebia acompanhamento médico e todos os cuidados necessários dentro da unidade.
Veja o que o Iapen disse sobre o caso:
Sobre a medicação, visando a segurança do próprio apenado, existem regras para entrada de medicamentos e outros ítens que precisam ser seguidas, mas no caso de medicamentos prescritos pelo médico, não há impedimento.
Destacamos que o apenado estava sendo devidamente acompanhado pela médica psiquiatra da unidade e recebendo os devidos medicamentos.
Toda assistência foi prestada ao Michel, com psiquiatria, medicamentos, assistência social e segurança.
Quanto aos episódios de violência envolvendo o apenado, em uma ocorrência o mesmo foi vitima de agressão e em outra o mesmo foi agressor ao tentar contra a vida de outro recluso.
Não efetivando o fato por intervenção dos policiais que não deixaram que a situação se agravasse.
O detento recebeu atendimento médico necessário logo após ambos os fatos.
Quanto a ele ficar sozinho na cela, o Iapen destaca que foi um pedido do próprio detento, que foi atendido, com o intuito de garantir a segurança do mesmo e de outros apenados, visto os episódios de violência anteriores.
O Iapen destaca ainda que se coloca à disposição da família em caso de qualquer dúvida.