Faz 44 anos que o Flamengo jogou a Libertadores pela primeira vez. Nos 30 anos seguintes, voltou a jogar o torneio apenas outras nove vezes, sem voltar a vencê-la. Agora, na nona disputa consecutiva desde 2017, chega ao seu quarto título, o terceiro num espaço de sete edições. Acima de tudo, a conquista de 2025 parece um marco definitivo de novos tempos. Não apenas na relação entre o clube e a maior competição sul-americana, mas também no status do clube em um uma época em que toda a ordem econômica do futebol global foi redesenhada.
Houve tempos em que a presença de qualquer clube brasileiro na Libertadores era prenúncio de um ano especial. Havia uma preparação, porque num ambiente em que os times do país se revezavam no topo da hierarquia técnica do país, de uma forma quase cíclica, ninguém era capaz de dizer quando seria a oportunidade seguinte de disputar o torneio.
Em 2019, quando o Rio viveu a catarse da primeira vitória de Lima, celebrava-se o reencontro com as grandes ambições, com os maiores troféus. O que se via no horizonte era a perspectiva de uma nova fase de conquistas. Desta vez, no retorno à capital peruana, a cabeçada de Danilo, aos 67 minutos de uma decisão mais dura do que vistosa, parece uma definitiva afirmação. O Flamengo traduz em títulos, em frequência de conquistas pesadas, a sua condição de potência sul-americana.
A presença na Libertadores não é mais episódica, é quase uma certeza do calendário atual de clubes como o Flamengo e o Palmeiras. E a condição de favorito, de um dos times a ser batido, obedece à mesma lógica. Porque, no futebol de hoje, com a diversificação nas fontes de geração de receitas comerciais dos clubes, algo cada vez mais atrelado ao tamanho da torcida e à capacidade de mobilização, há pouquíssimos sinais de que o Flamengo sairá do topo da pirâmide econômica. Aliás, a própria formação do elenco tetracampeão sul-americano é outro sinal dos tempos.
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Talvez passe despercebido, mas este Flamengo conta com nove jogadores que disputaram Copas do Mundo por Brasil, Uruguai, Equador e Espanha: Danilo, Alex Sandro, Varela, Viña, Saúl, Plata, De La Cruz, Pedro e Arrascaeta. Algo que, há poucos anos, soava impensável num continente exportador de talentos. Assim como o perfil dos jogadores que compõem este grupo. Os volantes Jorginho e Saúl, o primeiro um campeão da Eurocopa pela Itália e o segundo um ex-integrante da seleção espanhola que foi ao Mundial da Rússia, são nomes que no imaginário brasileiro estavam, há poucos meses, muito mais identificados com a Champions do que com a Libertadores. A capacidade de repatriar defensores como Danilo e Alex Sandro, de reter Arrascaeta por sete temporadas, tudo isso dialoga com a nova realidade.
E por falar em novos tempos, a presença de Filipe Luís à beira do campo também pode prenunciar novos ventos num país ansioso pelo surgimento de novos treinadores. Se o processo de formação ainda engatinha por aqui, parece justo esperar que o mercado internacional volte a se abrir através de ex-jogadores com carreira respeitada na elite europeia, habituados aos vestiários globalizados, influenciados por treinadores consagrados. E que, a isso, somem um interesse quase obsessivo pelo estudo do jogo. Ou seja, Filipe Luís parece ser o protótipo deste novo treinador. De agora em diante, o torcedor do Flamengo divide suas atenções entre o campo e a tentativa de decifrar quais os planos de carreira de Filipe. Tê-lo pelo máximo de tempo possível parece ser a via mais rápida para novas conquistas.
Se cada Libertadores tem seu sabor, o tetracampeonato de 2025 parece a imagem de um Flamengo que consolida sua nova era.
Acertos
Filipe Luís foi feliz nas escolhas para a final de sábado. Optou por Danilo, e não por Léo Ortiz, e o zagueiro fez o gol do título. Já Samuel Lino teve bons momentos atacando e defendendo um setor perigoso do Palmeiras. Na parte tática, num jogo de poucas chances e muitos cuidados, o Flamengo foi melhor: explorava bem os encaixes individuais do Palmeiras e tinha movimentos para infiltrar às costas da defesa.
O terceiro
Danilo é destes jogadores que oferece garantias em partidas de alta carga emocional. Pode já não ser o mais rápido defendendo grandes espaços, mas protege bem a área e tem ótima saída de jogo. No sábado, se o gol decisivo já era suficiente para colocar seu nome nas memórias rubro-negras, Danilo foi além: tornou-se apenas o terceiro jogador do Flamengo a fazer gol numa decisão. Antes só Zico e Gabigol haviam conseguido.
Elegância
Abel Ferreira se comportou mal em muitos momentos nos quais se viu questionado. No sábado, em Lima, foi extremamente elegante ao se referir à superioridade do Flamengo e reduzir o peso do erro da arbitragem, que deveria ter expulsado Pulgar. Seu time, no entanto, voltou a apresentar uma escassez de repertório ofensivo. O Flamengo teve méritos, mas o Palmeiras ficou muito restrito a bolas longas e pouca elaboração.