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sábado, abril 20, 2024

Artigo: Márcio Bittar, por ele mesmo

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por Israel Souza*

Faz uns dias, circula em grupos do Whatsapp  um áudio de Márcio Bittar. Seu conteúdo é tão interessante que ganhou as páginas dos jornais locais.

No geral, a divulgação e as análises dedicadas ao áudio enfocaram o comentário sobre Gladson Cameli. Diz: “Gladson não é nem de perto  (sic) o candidato que eu gostaria de ter”.

Consideramos compreensível, mas um tanto forçada a tentativa de abalar a relação entre ambos somente com base nesse comentário que, no fundo, é até ‘fofo’.

A nosso ver, as partes mais eloquentes e contundentes do áudio dizem respeito ao próprio Márcio Bittar. São as partes em que ele se refere a Temer e às contrarreformas que ele vem defendendo e efetivando: a trabalhista e a previdenciária.

Embora reconheça Temer como “todo enrolado”, diz que as contrarreformas que ele vem implementando são importantes para o Brasil e que está torcendo por elas. Em palavras poucas. O homem do áudio, futuro candidato ao senado pela oposição, coloca-se como partidário de Temer e de suas contrarreformas.

E assume tal posicionamento com com uma franqueza e um entusiasmo  dignos de nota. Por isso, o áudio aqui referido pode ser considerado como uma espécie de apresentação e de declaração de intenções. Por ele, podemos ter uma ideia do que esperar de um possível futuro senador Márcio Bittar.

No áudio, Bittar afirma que a “reforma trabalhista foi fundamental, um marco no Brasil”, “acabou com a legislação fascista”. Em suma, Temer, o “todo enrolado”, teria, segundo ele, “modernizado as leis trabalhistas”.

Que ninguém se engane com tais palavras. Bittar não manifesta desprezo pela antiga legislação trabalhista por ela ser fascista. E, sim, por ela conceder direitos e garantias aos trabalhadores. O problema seria, então, não seu caráter fascista, mas sua dimensão popular, social.

Por isso, é que ele chama “modernização das leis trabalhistas” o ato de desamparar juridicamente os trabalhadores e desequilibrar, grandemente, as relações trabalhistas em favor dos patrões.

Com efeito, o que ele chama “modernização” colocou o trabalhador brasileiro numa condição de semiescravidão. Os impactos foram enormes. Já começamos a ver. Da noite para o dia, trabalhadores tiveram seus salários reduzidos a menos da metade. Demissão em massa ocorrendo em diversas latitudes do país. Trabalhadores que, ao recorrerem à justiça do trabalho, perderam causas e – pior! – tiveram que arcar com os custos do processo.

Por tanto, do ponto de vista dos trabalhadores, essa “modernização” é retrocesso, e não progresso. E, se Bittar considera tudo isso positivo, é porque assume, como seus, o ponto de vista e os interesses dos patrões.

Ainda no áudio, Bittar diz estar torcendo pela reforma da previdência. Neste ponto, fala, com alguma razão, de uns privilegiados que ganham muito e se aposentam cedo. Entretanto, diga-se de passagem, que nem Temer nem o Congresso mostram  disposição para enfrentar os verdadeiros privilegiados. No geral, esses são usados discursivamente para inflamar a população arrancar dela a aquiescência quanto à reforma.

Ora, como é consabido, a CPI do senado já mostrou que o alegado déficit da previdência é uma farsa e que a reforma, fundamentalmente,  visa a 1) liberar ainda mais o Estado de compromissos sociais com os de baixo; 2) fazer que uns trabalhadores sejam obrigados a recorrer aos bancos a fim de alimentá-los com planos de previdência privada e que 3) outros trabalhadoras  morram de trabalhar, sem nenhuma chance de aproveitar a aposentadoria com a qual contribuíram por toda uma vida toda.

No intuito de dar sustentação a seu posicionamento a respeito da reforma da previdência, Bittar alega ter 54 anos e que não tem aposentadoria ou pensão e que não está  pensando em parar de trabalhar.

Ora, o que sabemos do “trabalho” de Bittar é que, eleição após eleição, ele chega ao Acre para disputar cargos eletivos. Depois some. Então  temos notícia de que ele está atuando em outro estado, em cargos de confiança.

Como professor (uma das categorias criticadas no áudio), lido diariamente com centenas de alunos. Dias há em que saio de casa às 6 da manhã e só volto às 6 da tarde. Preparo aulas e provas e trabalhos aos sábados, domingos e feriados. Como pesquisador, não raro, meu tempo de trabalho se confunde com meu tempo de descanso. Nesse ritmo, o vigor e a saúde se desgastam com relativa rapidez.

Todavia, sou capaz de afirmar que, com um “trabalho” como o de Bittar, provavelmente eu chegue aos 100 anos dançando lambada e jogando capoeira.

Para ser ainda mais claro. O que sabemos do trabalho de Bittar é que ele disputa eleições. E que,  no geral, vem ao estado, de tempos em tempos, basicamente para isso. Disputar eleições.

Quando por aqui está, nesse “trabalho”, sempre encontra tempo para escantear correligionários seus, forjando golpes dentro dos mais diversos partidos por onde passa. Sintomáticas a esse respeito são suas relações com Bocalom e Major Rocha. Não é por acaso que Bittar troca de partido como quem troca de camisa.

Isso mostra que, mais que um programa partidário, ele tem sempre em mente um programa pessoal. A essa altura, fica claro que sua afinidade com Temer não se restringe ao apoio que dão às reformas que atacam os trabalhadores e favorecem os patrões. Ambos, Temer e Bittar, também gostam de golpear seus correligionários.

Guardemos isso. Apoiar um presidente ilegítimo como Temer diz muito sobre Bittar. Apoiar um candidato ao senado como Bittar diz muito sobre a oposição.

Termino fazendo um desafio a Bittar. Se ele está realmente certo de suas posições, que ele, com a mesma franqueza do áudio, as assuma em sua campanha, em suas propagandas eleitorais.

No mais, fique aqui registrado todo meu respeito, solidariedade e apoio aos trabalhadoras. Igualmente, fique aqui todo meu desprezo pelos parasitas políticos. Aos inimigos do povo, guerra sem trégua.

* Israel souza: Cientista político, professor e pesquisador do Instituto Federal do Acre/Campus Cruzeiro do Sul, onde coordena os projetos de pesquisa Trabalho, Território e Política na Amazônia e Miséria Política no Brasil. Autor dos livros Democracia no Acre: notícias de uma ausência (PUBLIT: 2014) e Desenvolvimentismo na Amazônia: a farsa fascinante, a tragédia facínora  (no prelo).

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