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quinta-feira, abril 25, 2024

“Não sou bolsominion”, afirma o pastor Silas Malafaia

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Como bom pastor, Silas Malafaia não fala palavrão. Quer dizer, fala, mas disfarça. “Político é soda”, dispara contra a classe que bajula e por quem é bajulado. Presença constante em Brasília, onde circula como conselheiro de Jair Bolsonaro, Malafaia, 63 anos, se tornou avalista do muito cobiçado apoio das igrejas de sua fé — ou pelo menos parte delas — ao projeto de reeleição do presidente. Mas garante que não diz amém a tudo que o que ele propõe. Carismático e envolvente, o pastor comanda a Vitória em Cristo, tronco da Assembleia de Deus que nasceu no Rio de Janeiro e hoje se espalha por dez estados, e exercita a dialética nas redes sociais, onde discorre sobre tudo. Vaidoso, acaba de fazer um implante de cabelo e costuma ostentar um Rolex dourado no pulso — ambos, diz ele, presentes de amigos. Nesta entrevista concedida em seu escritório num templo para 6 500 pessoas de sua igreja, Malafaia fala de sua relação com Bolsonaro, do arrependimento de ter apoiado Lula e da importância do voto evangélico.

Como os evangélicos vão se posicionar nas eleições de outubro? Nós representamos um terço da população, o que significa que, em tese, toda casa brasileira pode ter um evangélico. É uma multidão de gente que vai à igreja pelo menos uma vez por semana, ao contrário do que ocorre com os católicos, com sua parcela significativa de declarados não praticantes. A interação pessoal é muito poderosa e perpassa todos os assuntos, até política. Aliado a isso, há as redes sociais, que reverberam nossas ideias nacionalmente. Apenas dez pastores, eu incluído, somam mais de 60 milhões de seguidores. Nesses ambientes, tenho um bom termômetro do que o evangélico pensa. Acredito que Bolsonaro conta hoje com o apoio de 60%, 65% desse público.

Mas as pesquisas não apontam um empate de Lula e Bolsonaro entre os evangélicos? Os institutos estão errados. Eles não conhecem o mundo evangélico como eu. E há efeitos que só são sentidos com o tempo. Acumulei uma experiência interessante nas redes. Na época da greve dos caminhoneiros, fui contra e, de cada vinte comentários, dezenove me bombardeavam. Com argumentos, o jogo foi virando, virando, até virar de vez. No fim, me deram razão.

Por que, afinal, o senhor apoia Bolsonaro? Ele sempre se pronunciou abertamente contra aborto, casamento gay, os temas da pauta moral, e nunca carregou uma Bíblia para dentro da igreja, como vi Fernando Haddad e Manuela d’Ávila fazerem. Uma atitude, aliás, do tipo que não cola mais, que leva ao meme e ao deboche em nosso meio. Em 2018, ele falava contra a corrupção e a favor da segurança: “Tem que mandar matar, arrebentar vagabundo”. Isso tinha uma conexão direta com os anseios da sociedade. Agora, que fique claro: meu apoio ao Bolsonaro não me torna um bolsominion. Se tiver de criticar, critico.

O recente escândalo no MEC envolvendo dois pastores evangélicos que estariam trilhando um atalho para volumosas verbas federais é um desses casos ao qual o senhor tece críticas? O presidente simplesmente disse “atende eles aí”. Não mandou Milton Ribeiro (o ex-ministro da pasta) fazer nada fora da lei. Nunca apoiei Ribeiro, nem tenho amizade com ele, que também é pastor, mas não creio que seja corrupto. Foi um bobo da corte enredado por gente esperta. Certamente lhe faltou malícia política.

Como esse escândalo ecoou na comunidade evangélica? Não nos afetou em nada, por uma razão: saímos na frente exigindo uma investigação. Eram dois pastores sem relevância que agiam por conta própria. Assim que soube, liguei para o presidente e falei: “Demite, quebra tudo, tá demorando muito para agir”. Tem muito pastor picareta. Se soubesse que esses caras estavam perto do governo, teria atuado antes.

Questões como geração de emprego e renda, consideradas hoje favoráveis a Lula nas urnas, terão impacto no eleitorado evangélico? Ficar ao lado de Lula, na minha opinião, seria endossar a lógica do “rouba, mas faz”, um ditado horroroso, imoral, embora recorrente no Brasil. O PT encabeçou o governo mais corrupto da história do Brasil e não pode ser inocentado porque ajudou os pobres. Bolsonaro, aliás, criou um dos maiores programas de auxílio na pandemia.

O senhor já apoiou o PT. Por que mudou de lado? Apoiei o Lula em 1989 e 2002. Tinha expectativa de que um cara vindo da pobreza do Nordeste poderia resgatar o Brasil. Naquela época, as temáticas morais eram escondidas, não se falava de aborto nem de união gay. Fiz parte do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e compareci a audiências no Congresso. Aí percebi que uma hora o PT falava de respeito à vida e noutra, lutava por aborto. Havia uma diferença entre discurso e prática, e acabei pedindo para sair. Não foi meu único erro. Já apoiei também Leonel Brizola, Sérgio Cabral e Aécio Neves.

As denúncias de esquemas de rachadinha envolvendo os filhos do presidente da República não lhe causam incômodo? Vinte deputados estaduais do Rio de Janeiro foram envolvidos em escândalos de rachadinha. O filho do presidente é o 19º no quesito movimentação financeira. Ninguém fala dos outros dezenove, nem do primeiro, que é o próprio presidente da Assembleia Legislativa: André Ceciliano é acusado de movimentar 40 milhões de reais.

Mesmo relativizando as quantias, se as denúncias um dia forem comprovadas, se configurariam um delito, não? Tentar colocar a pecha de corrupção no presidente por causa de um filho não vai me convencer. Voto no presidente, não no filho dele. Quero saber é se o Bolsonaro fez rachadinha. Isso não foi provado até hoje.

Seu nome vem sendo usado por um falsário para apresentar denúncias à PGR contra o presidente. Ele chegou a achar que o senhor era mesmo o autor? Falo o tempo todo com o Bolsonaro e logo esclareci a situação. O resto é pura dor de cabeça. O delegado envia intimação, tenho de pagar advogado. Já arquivaram oitenta denúncias falsas feitas em meu nome, uma lambança com o único objetivo de me complicar com gente que nem conheço. Até tráfico e milícia entraram no bolo. Precisam pegar esse vagabundo.

Outra polêmica recente que o coloca sob holofotes diz respeito ao modelo Rodrigo Malafaia, casado com outro homem, que jura ser seu sobrinho-neto, mesmo diante de suas negativas. O que é verdade aí? Os avós dele não são irmãos dos meus avós, os pais sequer são primos de meu pai. É a mesma coisa que dizer que todo Araújo é da mesma família. Ainda que fosse meu filho, não seria responsável pelo comportamento dele. Poderia amá-lo, mas condenaria inteiramente sua postura.

Sua relação com Bolsonaro é feita de altos e baixos, certo? Sim. Ela começou com a minha sugestão para que ele e Michelle, que àquela altura tinham uma filha juntos, formalizassem a união. Aceitaram e eu celebrei o casamento. O problema veio em 2016, quando me levaram para depor em uma operação policial. Tentaram me envolver com uma quadrilha e corri para me defender. Reuni a imprensa e apresentei a cópia de um cheque no valor de 100 000 reais de uma doação que havia recebido justamente de um dos acusados. Mostrei minha declaração de imposto de renda, tudo certo. A tal operação aconteceu numa sexta-feira. Na segunda, diversos deputados me defenderam no Congresso. Bolsonaro não deu um pio.

Ficou ferido com isso? Fiquei. Eu havia permanecido do lado dele naquele caso envolvendo a deputada federal do PT, Maria do Rosário, que acendeu uma baita polêmica no Congresso e lhe rendeu um processo. No mês seguinte, durante uma pregação, mandei recado: “Tem gente que ainda vai ter dor de barriga, que, quando precisou de mim, ajudei.” A Michelle entendeu direitinho a indireta. E acabei me afastando dos dois. Mas nos reaproximamos em 2018. Bolsonaro queria falar comigo sobre seu projeto de sair candidato a presidente. Ainda era um zé arruela nas pesquisas e buscava meu apoio. Passaram-se três meses e pensei: “Esse cara defende o que acredito, vou apoiar esse caboclo”.

O senhor já indicou alguém para o governo? Em julho de 2020, sugeri o nome de Anderson Correia, reitor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), para o Ministério da Educação. O então ministro da Justiça, André Mendonça, defendia o Milton Ribeiro. Foi pau de uma semana, e o André acabou vencendo.

Qual é o verdadeiro projeto de poder dos evangélicos? Eu nunca cheguei numa reunião de liderança dizendo: “Temos de fazer um presidente nosso”. Não é esse o objetivo maior, nunca foi. Mais importante é ter representação e voz nas casas legislativas, eleger vereador, deputado e senador para que nos representem, espelhando a relevância que temos no conjunto da população brasileira.

Quais são as bandeiras evangélicas? Temos clareza de que não dá só para nos restringirmos à pauta religiosa. Ela sozinha não é capaz de mobilizar os evangélicos. Quando Anthony Garotinho se candidatou à Presidência, em 2002, não decolou, entre outras coisas, por martelar o tempo todo uma agenda de uma nota só. O que precisamos é de engrenagens para influenciar a política, o Judiciário, a cultura, as ciências, as artes, a economia e também o empresariado.

A que se deve o avanço da igreja evangélica no Brasil? A Igreja Católica oferece uma liturgia repleta de dogmas, desconectada das reais necessidades das pessoas. A parte da fé em Cristo, eles adiantaram para a gente em 50%. Nós, evangélicos, entramos oferecendo um cristianismo prático, para ser vivido 100% do tempo e não em duas horas de culto. Estamos varrendo a América Latina. Só eu, estou construindo dezessete templos. Não paro de inaugurar igreja.

O senhor foi apontado pela revista Forbes como o terceiro pastor mais rico do Brasil, com patrimônio de 150 milhões de dólares. Como chegou lá? Não procede. Processei a revista e eles se retrataram. Meu patrimônio é 2% disso. E olha que já passei aperto. Fundei uma editora para poder bancar horário de TV e eventos em estádios. Em 2015, a crise atingiu o mercado editorial e eu afundei junto. Entrei em recuperação judicial e estou pagando os credores. Atualmente, recebo salário da igreja.

E de quanto é esse salário? Meu amigo, o dia em que o papa e os bispos da Igreja Católica declararem o salário, eu digo o meu.

  • Fonte: Veja Abril.
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