A guerra comercial do presidente norte-americano Donald Trump contra o resto do mundo, principalmente contra a China, país ao qual impôs tarifas de importação em mais de 100% sobre os produtos chineses, acabará por beneficiar o Brasil e outros países da América do Sul interessados na ligação do continente com os oceanos Atlântico e Pacífico.

Guerra comercial entre EUA e China aumenta a pressa por corredor bioceânico entre Atlântico e Pacífico, passando pela Amazônia. Foto: Reprodução
E de quebra, beneficiar pelo menos 11 estados brasileiros, entre os mesmos o Acre, que faz fronteira com o Peru, onde o Oceano Pacifico poderá ser alcançado mais rapidamente para completar o interesse da China na chamada Nova Rota da Seda, que visa interligar os dois oceanos, estabelecer um novo marco nas relações diplomáticas e comerciais Chinesa com o continente sul-americano e diminuir, em pelo menos 20 mil milhas náuticas, a distância entre os continentes sul-americano e asiático.
Para que a Nova Rota da Seda financiada com o capital chinês, com gastos estimados em 7 bilhões de dólares, passe pelo Acre há o entrave de povos indígenas que vivem numa faixa de 250 quilômetros na chamada Serra do Moa, na região do Vale do Juruá, no Brasil, e Ucayali, no Peru.
A Serra na divisa entre os dois países, onde há um parque apontado como o de maior biodiversidade vegetal e animal da terra, por onde a BR-364 teria continuidade, ligado a cidades de Cruzeiro do Sul e Manacio Lima, no Acre, a Pucalppa, em Ucvayali, é objeto de várias ações no Ministério Público Federal (MPF), razão pela qual os estrategistas chineses e dos demais países interessados estudam também outras saídas capazes de, passando pelo Brasil, também alcançarem o Oceano pacífico. Para isso, além da passagem pelo Acre, o estrategistas estabeleceram pelo menos mis três opões.
São elas: A Rota 1, liga a Ilha das Guianas; A Rota 2 é a Amazônia, passando pelo Acre. A Rota 3 abrange o Centro-Oeste brasileiro e é chamada de Quadrante Rondon; A Rota 4 passa pelo Sul e Sudeste brasileiro, chamada de Bioceânica de Capricórnio, e a Rota 5 abrange o cone sul, chamada de Bioceânica do Sul.
Guerra envolve o Canal do Panamá
Essas rotas contam inclusive de estudo do Ministério do Planejamento, segundo revelou, em Rio Branco, a ministra Simone Tebet, ao participar de um seminário sobre o assunto no Acre, no ano passado.
O fato é que, sob a pressão tarifária norte-americana, a China tem pressa para alcançar o oceano pacífico e se livra também da dependência do cabal do Panamá, sobre o qual o presidente Donald Trump também já manifestou o interesse de retomá-lo para o domínio dos EUA.
O Canal é a travessia-chave para o comércio marítimo internacional. O Canal do Panamá foi inaugurado no começo do século passado como alternativa para encurtar distâncias. O Canal possui 77,1 quilômetros de extensão, e o tempo aproximado para cruzá-lo varia entre 20 e 30 horas. A alternativa ao canal é contornar o continente, nas pontas meridionais da África e da América do Sul, ou o Canal de Suez.
Em fevereiro, o Panamá se retirou do projeto Novas Estradas da Seda, em decisão tomada sob pressão de Trump, que alega que o Canal do Panamá está sob o controle de Pequim. Isso significou uma vitória diplomática para Washington, que teme a crescente influência de Pequim, especialmente sobre essa infraestrutura estratégica, vista pelos EUA como um risco à segurança.
Como o Canal do Panamá é ponto central para o comércio mundial, o afastamento de Pequim fortalece a influência norte-americana na região.
Desde 2017, Pequim tem investido pesadamente no Panamá, sobretudo em portos e logística, buscando facilitar seu comércio. Na condição de segundo maior usuário do canal depois dos EUA, a China esperava ter condições mais favoráveis para seus negócios. Mas, com as novas investias de Trump, a Chiba busca alternativas e tem pressa em encontrar o seu corredor bioceânico para estabelecer nova rota comercial via Argentina, Brasil, Chile e Paraguai.
Apesar de não ser novo, o projeto se insere no meio da guerra comercial que o gigante asiático trava com os Estados Unidos de Donald Trump. O principal objetivo do corredor é permitir que o Brasil e os vizinhos sul-americanos evitem as rotas tradicionais de navegação do Atlântico, reduzindo significativamente os tempos de trânsito e os custos logísticos para exportações agrícolas, como soja, carne e grãos.
Uma delegação chinesa esteve recentemente o Brasil para discutir grandes projetos de infraestrutura, incluindo o Corredor Bioceânico. A visita ocorreu no contexto dos acordos estratégicos assinados pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente chinês Xi Jinping durante a visita de Estado de Xi ao Brasil em novembro do ano passado. O presidente brasileiro vai retribuir a visita no próximo mês de maio.
Agora, o Corredor Bioceânico é visto como uma alternativa ao Canal do Panamá, que vinha garantindo a Pequim uma influência crescente na América Latina, antes “quintal” dos EUA.
O governo brasileiro já trabalha, via Ministério do Planejamento e Orçamento, com o desenvolvimento das cinco rotas de Integração e Desenvolvimento Sul-Americano, que fazem parte da agenda da integração regional. A pasta desenhou as cinco rotas após consulta aos 11 estados brasileiros que fazem fronteira com os países da América do Sul.
Acre na mesa das negociações sobre as alternativas de rotas
As rotas têm o duplo papel de incentivar e reforçar o comércio do Brasil com os países da América do Sul e reduzir o tempo e o custo do transporte de mercadorias entre o Brasil e os seus vizinhos e a Ásia.
No total, as rotas de integração contam com 190 obras que já estão no PAC e, por isso, têm recursos assegurados no orçamento. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aportou US$ 3 bilhões, e os bancos regionais de desenvolvimento – Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF) e Fonplata — aportaram mais US$ 7 bilhões. Mas ainda será necessário investimento em outros projetos de logística, em que podem entrar os chineses.
Na semana passada, em visita ao Brasil, os chineses se encontraram com representantes estaduais de Mato Grosso, Goiás, Rondônia e Acre para discutir as redes rodoviária, ferroviária e hidroviária do país. Eles visitaram, por exemplo, a Ferrovia de Integração Centro-Oeste (Fico), localizada em Goiás, obra que visa conectar as áreas produtoras de commodities agrícolas da região à malha ferroviária existente e aos portos do litoral brasileiro.
Eles também visitaram o porto de Ilhéus (BA) e o porto de Santos (SP), este último um dos maiores da América Latina, que está sendo expandido com investimento de US$ 486 milhões pela COFCO International, gigante chinesa do agronegócio. Na terça-feira (15), a comitiva chinesa também se reuniu com integrantes dos Ministérios dos Transportes, do Planejamento e Orçamento, da Agricultura e Pecuária e da Agência Infra S.A para conhecer parte da carteira do Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
“Estamos honrados em receber a delegação chinesa. Esta é uma oportunidade de estreitar nossos laços e mostrar a viabilidade para a construção desse corredor”, afirmou o secretário especial do Novo PAC, Maurício Muniz.
O Chile apresentou na última segunda-feira (14) o plano de obras de infraestrutura do Corredor Rodoviário Bioceânico. Em andamento há uma década, é considerado um dos projetos de infraestrutura mais importantes da América Latina, abrangendo 2.400 km.
O programa será um dos pontos centrais de discussão durante a visita oficial que o presidente do Chile, Gabriel Boric, fará ao Brasil na próxima semana.
Na quarta-feira (23), a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, que comanda o projeto Rotas de Integração Sul-Americana, estará com o ministro da Economia do Chile, Nicolas Grau, e empresários de diversos setores produtivos dos dois países. O evento será realizado na sede da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em Brasília (DF).
“Será um momento fundamental, porque fortalecerá os laços de confiança entre os setores público e privado dos dois países. Cada um está em uma ponta: o Chile diante do Pacífico e o Brasil diante do Atlântico. A rota bioceânica permitirá uma aproximação que trará mais empregos e mais renda para os dois países”, afirmou Tebet.

Uma das rotas exclui o Acre caso se mantenha os impedimentos relacionados à Serra do Moa; Projeto anterior, previa a passagem pelo Acre (segundo mapa). Foto: Reprodução
A ministra esteve no país asiático em meados de 2024, para buscar parcerias com a iniciativa privada e com o governo chinês. A principal rota que passa por Brasil e China é a Bioceânica de Capricórnio, que liga os portos brasileiros do sul do Brasil, nos estados de São Paulo, Paraná e Santa Catarina, aos portos de Antofagasta, Iquique e Mejillones, no Chile, passando pela região do Chaco paraguaio e pelas províncias argentinas de Salta e Jujuy. Mas há também a alternativa que atravessa os 11 estados brasileiros, chegando a Amazônia, via Mato Grosso, Rondônia, Acre e de lá alcançando o Peru, para chegar o no poro de Chankay construído também com capital japonês e inaugurado no ano passado.