A temporada 2022 do futebol brasileiro mal começou e diversos casos de violência envolvendo torcidas e invasão de campo foram registrados. Na quarta-feira, dia 25, torcedores do Gama e do Brasiliense deram início a uma briga generalizada nas arquibancadas do Estádio Mané Garrincha, em Brasília. Um extintor de incêndio chegou a ser usado na briga e a Polícia Militar interveio com bombas de gás lacrimogêneo. Atos de selvageria também ocorreram em São Paulo, Curitiba e Natal.
Um dia após o incidente, o clássico entre Athletico-PR e Paraná terminou em quebra-quebra na Arena da Baixada, com cadeiras sendo arremessadas e divisórias sendo derrubadas. Já nesta quarta-feira, torcedores do rubro-negro paranaense se envolveram em um novo tumulto, desta vez no jogo diante do Maringá. Durante a partida, os donos da casa arremessaram objetos em direção aos athleticanos, que revidaram a agressão derrubando a divisória e partido para cima dos rivais. Um torcedor rubro-negro usou uma barra de ferro para atacar os adeptos do Maringá. O caso foi relatado na súmula do jogo.
“De um ponto de vista negativo, a cultura de torcer possui a violência como característica de comportamento e forma de se expressar. Quando pensamos em violência, geralmente falamos da violência física, mas existe também a violência verbal. Essa cultura é pautada na ideia de virilidade, de transformar o ambiente hostil aos adversários”, diz Cleyton Batista, Doutorando em Educação na Universidade Federal da Bahia (UFBA) e pesquisador sobre assuntos relacionados à torcida no futebol. “O ambiente do futebol possibilita essas manifestações, mas é um reflexo de uma sociedade que banaliza a violência e isso se materializa também nas arquibancadas”, conclui.
O episódio mais lamentável, no entanto, aconteceu em Natal, também no último domingo. Uniformizadas de América e ABC tomaram conta de em um trecho da BR-101 na capital potiguar, transformando o local em um campo de batalha em plena luz do dia. Carros voltaram na contramão com medo, rojões foram atirados e um homem, envolvido na briga, foi espancado. Tudo foi filmado por moradores da região.
Durante a década de 1990, as tradicionais festas com bandeiras e públicos abarrotando estádios deram lugar a um crescimento das brigas nas arquibancadas – geralmente protagonizadas por uniformizadas. Dificilmente os fãs de futebol não relacionaram o episódio da faca na semifinal entre Palmeiras x São Paulo na Copinha deste ano com a batalha do Pacaembu. Em 1995, tricolores e palmeirenses invadiram o campo da final da Supercopa de Futebol Júnior e realizaram uma verdadeira batalha campal. O resultado foi um morto em 102 feridos.
Em 2003, o governo brasileiro sancionou o Estatuto do Torcedor (Lei 10.671/03), visando diminuir a onda de violência e instituir os direitos e deveres de quem frequenta os estádios. Entre os avanços da legislação, é possível apontar a criação de corpos policiais especializados no patrulhamento de arenas, como é o caso do Batalhão Especializado em Policiamento em Estádios (BEPE), no Rio de Janeiro. Em São Paulo, desde 2004, os clássicos são organizados com torcida única com o objetivo de evitar brigas no estádio e em outros pontos da cidade. No entanto, a medida é criticada.
“Apesar do avanço, falta fazer mais claro essa lei. Ainda não observamos um padrão para isso. Casos como esses do início do ano não têm a devida atenção, mas o caso da Copinha é possível que ganhe alguma repercussão (jurídica) por causa do apelo”, diz Batista. “É preciso uma participação maior dos clubes. O clube, de um modo geral, se coloca numa posição isenta, como se não houvesse responsabilidade pelo que acontece, quando justamente deveria ocorrer o contrário, pois ele tem uma influência forte sobre os seus torcedores.”
Fonte: Estadão