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sexta-feira, abril 19, 2024

“Estamos dominados pelas organizações criminosas”, afirma advogado Romano Gouveia

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Sempre houve conflito por disputa territorial

As rotas, que eram dominadas, passam a ser disputadas pelas facções criminosas que interiorizam o crime. As principais entradas de drogas vinham do Paraguai via Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, locais próximos dos grandes centros.

A partir daquele acontecimento, houve um novo rearranjo. Os maiores produtores de entorpecentes, o Peru e a Bolívia, aqui ao nosso lado, começam a discutir novas rotas. O Rio Solimões se tornou uma veia aberta e passou a ser disputado pela de Manaus, o que causou uma verdadeira guerra entre as organizações criminosas, sendo as maiores do brasil, a de São Paulo e a do Rio de Janeiro.

A estratégia adotada pelo poder público, até o final do governo de Tião Viana, foi negar a existência dessas organizações.

A localização estratégica do Acre, que facilita o roubo de carros e a troca rápida por drogas na fronteira, contribuiu para o crescimento rápido de uma organização criminosa acreana. Esta entrou em guerra com as concorrentes e a matança começou. E o que é mais estarrecedor: o poder público fez e faz cara de paisagem. Todos esses grupos tiveram uma origem comum: o nascimento em presídios, que é fruto da superlotação, da falência do sistema penal e do combate às drogas.

Uma política de segurança pública depende de uma política de Estado. Desenvolvimento deve gerar emprego e distribuir renda. Esses assertivas, que mais parecem vindas de um sociólogo, são do advogado criminalista Romano Gouveia, de 45 anos, ao fazer uma avaliação do sistema prisional do Estado.

Filho de uma família tradicional de Sena Madureira, que migrou para Rio Branco há 60 anos, mais precisamente para o bairro Cerâmica, onde possuem uma das padarias mais tradicionais da cidade, Romano disse que o estabelecimento foi já foi roubado onze vezes.

“Uma política de segurança não se restringe a construir presídios ou a comprar viaturas”, criticou, acrescentando que o Acre tem a maior população carcerária do país, proporcionalmente falando.
Atuando há dez anos na área, ele, que tem uma das bancas mais respeitadas do Estado, é pós-graduado em Direito Penal, Processual Penal e Advocacia Criminal.

Já foi o presidente da comissão de direito criminal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e, atualmente, integra o conselho da comunidade. “Não se combate a violência apenas prendendo pessoas ou transferindo-as sob os argumentos de que elas são perigosas”, contesta o advogado.
Romano Gouvea, que nunca se envolveu com a política partidária, foi convidado pela direção do PSD para ser candidato a deputado estadual nas eleições deste ano. Em seu escritório, ele recebeu a nossa reportagem para falar sobre isso, porém gastamos a maior parte do tempo debatendo a segurança pública. Vejam os principais trechos da entrevista:

Notícias da Hora – Como é o sistema prisional acreano?

Romano Gouveia – Caótico, falido e não ressocialização. É masmorra. Estamos voltando ao século 18. A pena de castigo já foi banida há séculos. Temos o afastamento do reeducando de sua família; não temos pavilhões para separar os faccionados dos não faccionados; e não temos alimentação adequada, saúde, educação nem cursos profissionalizantes. Os presos precisam trabalhar e estamos gastando para piorar essas pessoas.

Sendo que nas fileiras das organizações criminosas atuantes no estado do acre, alcançam em torno de 30 mil jovens.
Conforme o art.31 da Lei de Execuções Penais, senão vejamos:

Art. 31. O condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao trabalho na medida de suas aptidões e capacidade. Parágrafo único. Para o preso provisório, o trabalho não é obrigatório e só poderá ser executado no interior do estabelecimento.

“O método de recuperação Apac alcança um índice de quase 90%, ou seja, é uma referência nacional e internacional, provando que é possível a humanização do cumprimento da pena”

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Notícias da Hora – Bandido bom é bandido morto?

Romano Gouveia – De maneira nenhuma. Bandido bom é bandido ressocializado. A Apac (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados) tem um método que se dedica à recuperação e reintegração social dos condenados a pena privativa de liberdade, bem como socorrer a vítima e proteger a sociedade.
É auxiliar do poder Judiciário e Executivo. Sua filosofia é ‘matar o criminoso e salvar o homem’, a partir de uma disciplina rígida, caracterizada por respeito, ordem, trabalho e o envolvimento da família do sentenciado. O objetivo é humanizar as prisões, sem deixar de lado a finalidade punitiva da pena. A Apac nasceu em São José dos Campos (SP), em 1972, sendo idealizada pelo advogado e jornalista Mário Ottoboni. Hoje, a entidade, instalada na cidade de Itaúna (MG), é uma referência nacional e internacional, ou seja, alcança um índice de recuperação de quase 90%, provando que é possível humanizar o cumprimento da pena. Já foi implantado em mais de 100 unidades.

Notícias da Hora – E as transferências dos presos sob a argumento de eles são perigosos?

Romano Gouveia – Infelizmente, o nosso estado combate à violência apenas comprando viaturas, prendendo ou transferindo aqueles presos tidos como perigosos. Se transferência foi remédio correto e eliminasse o câncer, os estados de São Paulo e Rio de Janeiro eram uma maravilha. Nova York, como a operação ‘Tolerância Zero’, e a ‘Mãos Limpas’, na Itália, são exemplos de combates eficazes ao poder paralelo. Não existe uma única política de combate às organizações criminosas no Brasil. Onde se prende mais é justamente onde tem mais violência. Você já viu cadeias lotadas nos países nórdicos? Não vai demorar muito para chegarmos ao estágio que chegou o Rio de Janeiro. As nossas organizações criminosas são originárias de uma transferência de presos para o Rio Grande do Norte. Se esse intercâmbio continuar, talvez em pouco tempo teremos por aqui as ações chamadas de ‘novo cangaço’. Estamos profissionalizando os nossos detentos. Primeiro temos que tratar as pessoas dependentes químicas. Depois, implantar uma cultura familiar para que os nossos filhos não entrem no mundo das drogas. O ex-presidente Ronald Reagan dizia: cuidem dos seus filhos para que os traficantes não cuidem deles.

O preso gera lucro em razão de ter, por anos, empresas que lucram com os apenados, além do fato de ter o governo, sub alocado, recursos penitenciários.
Foram investidos cerca de R$: 2.000.000,00 no presídio local Antonio Amaro Alves, mais precisamente, no PAV.08, para os presos de segurança máxima, em meados de 2018, onde foram instalados bloqueadores de sinais, porém, o prédio se encontra como depósito, pois foi construído com frágeis tijolos de 8 furos, e os responsáveis jogaram o recurso público na lata do lixo.

“Não existem políticas de combate às organizações criminosas no Brasil” 

Notícias da Hora – Estamos num estado subdesenvolvido e sem expectativas. Isso só piora?

Romano Gouveia – Aqui é o único local do mundo onde uma fábrica da Coca Cola fechou. Nem na Venezuela ou Argentina isso aconteceu. Como diz um amigo meu, a única coisa que nós fabricamos no Acre são os faccionados. Estamos gastando, por preso, cerca de R$ 6 mil reais mensais para piorar pessoas. No projeto Apac um preso custa um salário mínimo e meio.

Notícias da Hora – Como o pré candidato a deputado estadual, o que senhor propõe para sairmos dessa situação?

Romano Gouveia – Eu tenho esse olhar para o papel do poder público. Temos que fazer projetos para que as indústrias cheguem ao presídio. Preso dá lucro. Eles podem produzir tudo, ou seja, as suas roupas, os seus calçados, a sua alimentação, as suas bolas, os móveis, entre outros. Quando ele sair de lá, será um profissional qualificado e cidadão. Também temos projetos para os policiais civis, militares e penais.
Temos ainda um projeto para reduzir o preço do pão, através de isenções, porque é um dos mais caros do país. Também proponho fazer uma cooperativa de um banco estadual ou recuperar o extinto Banacre. Não seremos da política velha nem da nova, mas das ideias e das propostas para desenvolver o Acre.

Notícias da Hora – É possível conciliar ética e política?
Romano Gouveia
 – É necessário. A ética é para estar presente em nossas vidas pessoais, interpessoais e profissionais. A política é para servir as pessoas, como já diziam os gregos e depois São Tomás de Aquino.

“Estamos gastando R$ 6 mil (preço mensal por preso) para piorar pessoas”

  • Por Jorge Natal.
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